28 de dezembro de 2012

Parte 4. A Igreja nos Caminhos de Deus - Ef 2:11-22



Na primeira parte da epístola ao Efésios (Ef 1 e Ef 2:1-10) a Igreja é apresentada
em relação a Cristo na glória, segundo os conselhos de Deus. Isso prepara o caminho para
uma visão muito diferente da Igreja – a sua formação e testemunho na terra segundo os
caminhos de Deus.

Há uma vasta diferença entre os conselhos de Deus para a glória e os caminhos de
Deus na terra. Compreendendo essa distinção, veremos que a Igreja não tem apenas um
destino glorioso quando unida a Cristo no céu, segundo o propósito eterno de Deus, mas
que ela também tem uma existência na terra, e um grande lugar nos caminhos de Deus aqui
em baixo. É esse aspecto da Igreja que é trazido para diante de nós em Efésios 2:11-22.

Para que possamos entender este aspecto muito importante da Igreja, o apóstolo
lembra-nos da posição distinta mantida por Israel nos tempos antes da cruz. Naquele tempo
existia uma distinção muito grande entre judeu e gentio. Nos caminhos de Deus na terra o
judeu gozou de um lugar privilegiado no qual o gentio era um completo estrangeiro. Israel
formava uma comunidade terrena com promessas terrenas e esperanças terrenas. Eles
tinham uma relação exterior com Deus. A adoração religiosa, a organização política, as
ocupações diárias, os assuntos domésticos, tudo deles, do ato mais alto de adoração ao
menor detalhe da vida, eram regulados pelas ordens de Deus. Esse era um privilégio imenso
no qual os gentios, como tal, não tiveram nenhuma parte. Não era que os judeus eram um
pouco melhores do que os gentios, visto que à vista de Deus, a grande maioria dos judeus
era tão má quanto os gentios, e alguns até mesmo piores; e de outro lado, houve gentios
individuais que eram homens realmente convertidos, tais, por exemplo, como Jó. Mas nos
caminhos de Deus sobre a terra, Ele separou Israel dos gentios e deu-lhes um lugar de
privilégio exterior especial; ou mesmo se não convertido (como de fato foi o caso da grande
maioria) era um privilégio imenso ter todos os seus assuntos regulados de acordo com a
perfeita sabedoria de Deus. Os gentios não tiveram tal posição no mundo. Eles não
gozavam de nenhum reconhecimento público por Deus. Os seus assuntos não eram
regulados pelas ordenanças de Deus. E as próprias ordenanças que regulavam a vida do
judeu, severamente mantinham judeu e gentios separados.

Assim o judeu teve um lugar na terra de proximidade exterior a Deus, enquanto o
gentio estava exteriormente longe sem conexão reconhecida com Deus no mundo.

Mas Israel falhou completamente em corresponder aos seus privilégios. Eles se
viraram de Jeová para os ídolos. Os mandamentos e as ordenanças de Deus, que deu a eles
sua posição impar, eles a desconsideraram completamente. Finalmente, crucificaram o seu
Messias e resistiram ao Espírito Santo. Como resultado perderam, por enquanto, o seu lugar
especial de privilégio na terra, foram desapossados de sua terra e espalhados entre as
nações.

Este colocar de lado a Israel prepara o caminho para a mudança maravilhosa que
teve lugar nos caminhos de Deus na terra. O vislumbre vívido no passado dado pelo
Espírito de Deus nos versos 11 e 12 apenas torna o contraste mais notável, visto que depois
da rejeição de Israel, Deus, na busca dos Seus caminhos, trouxe à luz a Igreja e assim funda
um círculo de bênção inteiramente novo, inteiramente fora dos círculos judeu e gentio.

Este novo começo acontece na ocasião do fluir da graça de Deus de um modo
muito especial ao gentio. Sai o chamamento para o gentio; não, de fato, que o judeu esteja
excluído do novo círculo de bênção, pois, como veremos, a Igreja é composta de crentes
tanto dentre os judeus como dentre os gentios.

Mas se o gentio deve ser conduzido aos privilégios inestimáveis e às bênçãos do
novo círculo – se o gentio dever ter parte na Igreja – isso deve ser de uma forma justa. Por
isso a cruz é uma vez introduzida (verso 13). A cruz já foi referida em Efésios 1 em
conexão com o cumprimento dos conselhos de Deus. Aqui em Efésios 2 a cruz é referida
em conexão com os caminhos de Deus na terra. Pelo sangue de Cristo os pecadores gentios
são colocados para perto de Deus, sendo trazidos do lugar distante no qual o pecado os
tinha colocado, a um lugar de proximidade. Não uma mera proximidade exterior, por meio
de ordenanças e cerimônias, mas uma proximidade vital que só é totalmente expressa em
Cristo mesmo, ressuscitado dos mortos e aparecendo diante da face de Deus por nós. Assim
é dito: “em Cristo Jesus vós... sois trazidos para perto pelo sangue de Cristo”. Os nossos
pecados nos coloca longe, mas o precioso sangue não apenas nos lava dos nossos pecados,
ele faz mais, infinitamente mais – nos leva para perto. O sangue de Cristo declara a
enormidade do pecado que exigiu tal preço, proclama a santidade de Deus que não poderia
ser satisfeita com um preço menor, e revela o amor infinito que pode pagar o preço.

Mas isso, embora necessário para a formação da Igreja, não constitui em si mesmo
a Igreja. A Igreja não é simplesmente um número de indivíduos “colocados juntos”, pois
isso será verdadeiro para todo santo de todas as eras comprado pelo sangue. Há mais
necessidades; não só os indivíduos devem ser “colocados juntos” mas os crentes judeus e
gentios devem ser “feitos um” (verso 14). Isso, também, a cruz de Cristo realizou. Ali
Cristo derrubou a barreira entre judeu e gentio. A inimizade entre judeu e gentio foi
causada pelas ordenanças que excluíam o gentio de ter parte com eles. Através dessas
ordenanças o judeu pode se aproximar de Deus de um modo exterior enquanto que o gentio
não poderia. Mas na cruz Cristo aboliu completamente a lei das ordenanças como um meio
de se aproximar de Deus e fez um novo caminho de aproximação pelo Seu sangue. O judeu
que se aproxima de Deus com base no sangue acaba com as ordenanças judaicas. O gentio
sai da sua distância de Deus; o judeu, sai da sua proximidade dispensacional, e ambos são
feitos um no gozo de uma bênção comum diante de Deus, nunca antes possuída por eles. Os
crentes gentios não são levantados ao nível de privilégios dos judeus. Os Judeus não são
rebaixados ao nível dos gentios. Ambos são levados para uma terra inteiramente nova para
um plano imensamente mais alto.

Mas até mesmo isso não exprime a verdade completa da Igreja. Se o apóstolo
tivesse parado aqui, de fato deveríamos ver que os crentes são trazidos para perto pelo
sangue e feitos um já que foi retirada toda a inimizade, mas poderíamos ter sido deixados
com o pensamento de que somos feitos uma companhia em feliz unidade. E de fato isso é
uma verdadeira benção, mas, ainda assim, muito longe da plena verdade quanto à Igreja.
Portanto o apóstolo vai em frente e nos diz que não somos apenas “colocados juntos” e não
apenas “feitos dos dois um”, mas que fomos feitos “um novo homem” (verso 15), “um
Corpo” (verso 16), habitado “por um Espírito” por quem temos o acesso ao Pai (verso 18).
Isso, de fato, apresenta a verdade completa da Igreja – o Corpo de Cristo – que, nos
caminhos de Deus, está sendo formado na terra.

Deus não está apenas salvando almas de judeus e gentios com base no sangue, Ele
não está apenas reunindo os tais em unidade, mas está os formando em um Novo Homem
do qual Cristo é o glorioso Cabeça, os crentes são os membros do Corpo, e o Espírito Santo
o poder de união. Isso é muito mais do que unidade; é união. A Igreja não é simplesmente
uma companhia de crentes em feliz unidade, mas uma companhia de pessoas que são os
membros de Cristo e uns dos outros em íntima união. E o Novo Homem não é meramente
novo em um ponto do tempo, mas o é de uma ordem inteiramente nova. Antes da cruz,
como vimos, havia dois homens, o judeu e o gentio, odiando um ao outro e em inimizade
com Deus. Agora nos caminhos maravilhosos de Deus “Um Novo Homem” nasceu. Um
Novo Homem que inclui todo santo na terra unidos por um Espírito a Cristo, o ressuscitado
e exaltado Cabeça.

Unidos com a formação da Igreja de Deus na terra são três as grandes verdades às
quais o apóstolo se refere: a reconciliação com Deus, a pregação da paz aos pecadores e o
acesso ao Pai por parte de santos.

Primeiro, tanto judeu como gentios são reconciliados com Deus em um Corpo
(verso 16). Deus não estava contente que o gentio tivesse que permanecer distante Dele ou
que o judeu tivesse um lugar de mera proximidade exterior, mas a uma distância real tão
grande quanto o gentio. Nem Deus estava contente que o judeu e o gentio tivessem que
permanecer distantes um do outro. Por isso, na cruz Ele operou tão maravilhosamente que
ambos foram trazido para perto Dele, e ambos foram trazidos para perto um do outro,
formando um Corpo sobre o qual Deus pode olhar com complacência. A cruz matou a
inimizade entre crentes gentios e judeus, como também aquilo que uma vez esteve entre
ambos e Deus. Nada poderia mais perfeitamente expressar a remoção completa da
inimizade do que o fato dos crentes judeus e gentios serem formados “em um Corpo”. Não
é dito neste verso “Um Novo Homem”, porque isso inclui Cristo o Cabeça, e nenhum
pensamento de reconciliação pode ser conectado a Cristo. São aqueles que compõem o
Corpo que precisam de reconciliação, não Aquele que é o Cabeça.

A segunda grande verdade é que o Evangelho da paz é pregado aos gentios que
estavam longe e aos judeus que estavam dispensacionalmente perto. Podemos entender bem a introdução da pregação em uma passagem que mostra como a Igreja é formada na terra. Sem a cruz não pode haver nenhuma pregação, e sem a pregação não haveria nenhuma Igreja. Cristo é visto como o Pregador, muito embora o Evangelho que Ele prega seja proclamado instrumentalmente por outros. Lemos sobre os discípulos que “eles foram
adiante e pregaram em todo lugar, o Senhor cooperando com eles” (Mc 16: 20).

Há uma terceira verdade de grande bem-aventurança. Através de um Espírito
ambos (judeu e gentios) temos acesso ao Pai. A distância não é retirada apenas do lado de
Deus, mas também é retirada do nosso lado. Pela obra de Cristo na cruz Deus pode nos
atrair para perto, pregando a paz, e pela obra do Espírito em nós podemos nos achegar ao
Pai. A cruz nos dá o nosso título de posse para chegarmos perto; o Espírito nos permite usar
nosso título de posse e praticamente nos achegar ao Pai. Mas se o acesso é pelo Espírito,
então claramente não há nenhum lugar para a carne. O Espírito exclui a carne de toda
forma. Não é por edifícios, ou rituais, ou órgãos, ou coros, ou uma classe especial de
homens que ganhamos o acesso ao Pai. Não, todas essas carnalidades significam que
quanto mais elas impressionam o homem natural mais eficazmente barram todo o acesso ao
Pai. É através do Espírito, mas mais, é através de “um Espírito”, e por isso na presença do
Pai tudo é de um acordo. Como justamente cantamos:

“Nenhuma nota dissonante faz o som ali discordante”.

As chatas e baixas reuniões da assembléia não resultam do fato solene de que
ousamos trazer na presença do Senhor a carne não julgada? Ou ainda, as reuniões que por
outro lado alegres são repentinamente abaladas por um hino impróprio ou um ministério
intempestivo, porque não somos todos guiados por um Espírito. Falamos assim para encher
alguns com um medo mórbido pela apresentação daquilo que extinguiria o Espírito e assim
os silenciaria? Ao contrário, deixe esse tal lembrar-se de que o seu silêncio pode ser tanto
uma intrusão da carne como o ardor dos outros. Deixe que todos julguem a si mesmos e
então entrem na presença do Senhor. Então, de fato, o Espírito estará livre para dar acesso
ao Pai.

Até aqui vimos a Igreja como o Corpo de Cristo; mas nos caminhos de Deus na
terra a Igreja é vista em outros aspectos, dois dos quais são trazidos diante de nós nos
versos finais do capítulo (versos 19-22). Primeiro, a Igreja é vista como crescendo para “ser
um templo santo no Senhor”; em segundo lugar, como “morada de Deus”.

No primeiro aspecto a Igreja é comparada com um edifício bem ajustado que
cresce para templo santo no Senhor. Os apóstolos e os profetas formam o fundamento,
sendo o próprio Cristo a principal pedra de esquina. Por toda a dispensação cristã os crentes
estão sendo acrescentados pedra por pedra até que o último crente seja colocado e o edifício
concluído seja exposto na glória. Este é o edifício do qual o Senhor diz em Mateus 16: “Eu
edificarei a Minha Igreja, e as portas do hades não prevalecerão contra ela”. Cristo é o
construtor, não o homem. Por isso, tudo é perfeito, e nada além das pedras vivas fazem
parte deste edifício santo. Peter nos dá o significado espiritual deste edifício quando nos diz
que as pedras vivas são feitas uma casa espiritual “para oferecer sacrifícios agradáveis a
Deus”, por um lado, e “anunciar as virtudes” de Deus, por outro (1 Pe 2:5, 9). Em
Apocalipse 21, João tem uma visão do edifício concluído que desce do céu da parte de
Deus radiante com a glória de Deus. Então, de fato, daquele glorioso edifício sacrifícios
incessantes de louvor se elevam até Deus, e um testemunho perfeito das excelências de
Deus fluirá para o homem.

Então o apóstolo, ainda usando a figura de um edifício, apresenta outro aspecto da
Igreja (verso 22). Ele não vê mais os santos como sendo edificados em um templo
crescente, mas como formando uma casa já completa para a habitação de Deus através do
Espírito. Todos os crentes na terra a qualquer dado momento são vistos como formando a
habitação de Deus. Mas o apóstolo não diz simplesmente que “sois edificados”, mas
“juntamente sois edificados para morada de Deus em Espírito”, isto é, a morada é formada
de crentes judeus e gentios “juntamente edificados”. O lugar de morada de Deus é marcado
pela luz e pelo amor; por isso, quando o apóstolo chega na parte prática da epístola, ele no
exorta como a filhos queridos a “andar em amor”, e “andar como filhos da luz” (Ef 5:2, 8).
A casa de Deus é por essa razão um lugar de bênção e testemunho: um lugar onde os santos
são abençoados com o favor e o amor de Deus; e, assim abençoados, eles se tornam um
testemunho para o mundo em torno deles. Em Efésios a morada de Deus é apresentada
segundo a mente de Deus, e por isso somente o que é verdadeiro é contemplado. Outras
Escrituras mostrarão como, infelizmente, em nossas mãos a habitação foi corrompida até
que finalmente lemos que o julgamento deve começar pela casa de Deus.

Assim neste capítulo temos uma tripla apresentação da Igreja. A Igreja é vista
como o Corpo de Cristo, composto de crentes judeus e gentios unidos a Cristo na glória,
formando assim um Novo Homem para mostrar tudo o que Cristo é como o Homem
ressuscitado, o Cabeça sobre todas as coisas. Então vamos nos lembrar de que a Igreja não
é apenas “um Corpo”, mas é “O seu Corpo”, como lemos, “a Igreja que é o Seu Corpo”. E
como o Seu Corpo é “a plenitude Dele”. Ela é cheia de tudo o que Ele é para expressar tudo
o que Ele é. A Igreja – o seu Corpo – deve ser a expressão da Sua mente, justamente como
os nossos corpos dão a expressão ao que está em nossas mentes.

Então a Igreja é um templo que cresce composto de todos os santos de todo o
período cristão onde os sacrifícios de louvor ascendem a Deus e as excelências de Deus são
mostradas aos homens.

Finalmente, a Igreja é vista como um edifício completo na terra, composto de
todos os santos em qualquer dado momento, formando a habitação de Deus para abençoar
Seu povo e testemunhar ao mundo


Por HAMILTO SMITH.

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